23/07/2008

O que podemos aprender com Sartre e Heidegger?

Tradução Livre minha do artigo da McKinsey de James Ogilvy

"Eu me lembro do dia que percebi que o mundo estava ficando estranho e imprevisível ...nem mesmo as abordagens convencionais de previsão de mercado estavam funcionando mais.

Isso foi em maio de 1985. Eu fazia parte de uma equipe que analisava os resultados de uma pesquisa nacional sobre os hábitos e consumos dos americanos. O programa era chamado de Values and Lifestyles (VALS) e era baseado na hierarquia de necessidades de Abraham Maslow e na teoria e prática de segmentação de mercado a qual vinha sendo utilizada por 20 anos.


Naquele dia, percebi que a sistemática da VALS estava perdendo o seu poder de previsão. As pessoas não estavam mais se comportando de acordo com um estereótipo. As pessoas se comportavam "certinhas" durante o dia e punks durante a noite. Na época, isso foi muito ruim, pois nossos clientes nos pagavam para utilizar a segmentação de mercado para atingir diferentes estereótipos de consumidores com seus produtos.

Mas, pensando mais humanamente, percebi que foi uma boa notícia para o espírito humano. Essa tendência mostrava que a liberdade estava "flexionado seus músculos". As pessoas estavam se comportando menos previsíveis. Elas estavam acabando com os estereótipos.

Como fui treinado como filósofo, imediatamente saquei o que estava acontecendo. Os consumidores americanos, sem influência direta de Jean-Paul Sartre ou Martin Heidegger, tinham descoberto, naturalmente, algo que esses filósofos chamaram de liberdade existencial.

Atualmente, não conheço nenhuma sistemática de segmentação ou análise de mercado que seja gerenciada que capture padrões de comportamento de uma maneira confiável.

Essa realização tem implicações q transcedem o marketing. Para as empresas, manter consumidores menos previsíveis que os consumidores tradicionais requer uma capacidade de inovação.

A economia tradicional de produção sempre atuou no campo da previsão já q operava no reino da necessidade. A nova economia, diferentemente, atua no reino da liberdade.


Mas, o que isso significa?
O existencialismo é a filosofia que ressalta a importância e a robustez de uma escolha individual. Em um mundo onde temos que realizar muitas escolhas com poucas orientações, o existencialismo oferece uma abordagem interessante — talvez a única:


Por exemplo, no Vale do Silício, há um ditado:


“Quem precisa de um futurista para nos dizer sobre o futuro?
Nós estamos construindo o futuro!"

Isso é puro existencialismo!

Não há como ser todas as coisas para todas as pessoas. Precisamos saber dizer "não" para algumas possibilidades, a fim de atuar estratégicamente.

Os antigos filósofos, particulrmente Aristóteles, entendiam a mudança como um crescimento biológico:
Por exemplo, uma semente de um carvalho, ao crescer, não pode ser nada mais do que um carvalho. É a sua essência. A semente não tem a opção de se reinventar. Isso basicamente mostra o que eles chamaram de essencialismo.

O termo existencialismo ganha significado quando em contraste com o essencialismo.
Adotar o essencialismo nos seres-humanos é aceitar a direção de um caminho pré-determinado. O existencialismo, o contrário.
O estrategista existencial planeja cenários para lidar com a liberdade. Ele cria uma gama de possibilidades para o bem ou para o mal.

Heidegger argumentava que o senso de nossa própria mortalidade poderia modelar o nosso senso de fragilidade das nossas premissas. E o desenvolvimento de melhores e piores cenários poderiam nos acordar para o precioso sentido da vida, pois gera motivação e inspiração para o sucesso.

Estratégia & Competitividade
O futuro, de acordo com a filosofia essencialista, é como um tapete oriental ainda enrolado: o conceito está lá, vc somente não pode vê-lo. E como todo tapete oriental, seu conceito provavelmente é repetitivo. Regras tradicionais. O passado governa o presente. Não há grandes surpresas.

Para um existencialista, o futuro é um campo aberto, indeterminado de possibilidades ainda não testadas. Para eles, a existência precede a essência. Isso não quer dizer que ninguém possua uma essência. Mas, sim que a essência dos seres-humanos livres é conquistada, atingida em vez de prescrita.

Você passa a ser resultado de suas decisões. Não há crises de identidade. Você não é resultado somente dos genes que herdou, ou das circunstâncias as quais envolveram seu nascimento. Mas, também, é resultado do que vc escolheu fazer com tudo isso, outro objeto de liberdade existencial.

Urgências
Tal situação de mudança constante, sem padrões, irão clamar cada vez mais pelas estratégias que deveriam ter sido desenvolvidas antes dos momentos de urgência. Planejamento de cenários devem estar inseridos nessas estratégias, caso contrário, há grande risco de, rapidamente, a estratégia não ser mais autêntica.

Mas, como poderia imaginar um cientista do séc. XIX prever algo como velocidade de Gb/s, engenharia genética, céluas de combustíveis, telefone celular e etc? Se aprecia essa falta de previsão, vc está em uma posição que possa apreciar uma estratégia existencial.

Abandonar o essencialismo do futuro, previsível por princípio, é assumir a necessidade de uma série de orinetações para tomar decisões dentro de uma gama de possibilidades.
Como filosofia, o existencialismo ressalta que nós temos escolhas limitadas. E nos impulsiona a abandonar as velhas restrições impostas pelas tradições e adotar novos formatos.

No seu texto clássico de gerenciamento "In Search of Excellence: Lessons from America’s Best-Run Companies (Harper & Row, 1982), Thomas J. Peters e Robert H. Waterman Jr. definiram que o trabalho de um gerente deve ser o “meaning making”, ou a "contrução significativa", ou "o fazer com relevância". Os filósofos existencialistas elaboraram algumas idéias que têm imediata relevância às práticas estratégicas: a finitude, o ser em direção à morte, o cuidado,
o estar-lançado e a autenticidade.

Finitude
É o princípio existencial mais próximo da noção convencional da estatégia corporativa, o que dificulta as decisões já que não se pode fazer todas as coisas. De fato, nessa vida efêmera, você pode terminar praticamente tudo, mas não fazer de tudo. Não há tempo. Se vc escolher ser açougueiro, não pode ser padeiro. Não há tempo. Entender a finitude ajuda ao estrategista existencial focar nas contrapartidas que a organização enfrenta: "Podemos ter o preço mais baixo ou a qualidade mais alta, mas dificilmente os dois. Há escolhas que precisam ser feitas".
Nem todas as boas coisas andam juntas. Se vc não estiver dizendo "não", não estará agindo estrategicamente.
A IBM teve uma decisão estratégica decidiu sair do mercado de consumo para concentrar no mercado de serviço. A Hewlett-Packard Company cortou a Agilent Technologies Inc. pois medir e testar não era a sua competência principal.

Ser em direção à morte
Se acha que vc é imortal então vc deve agir como se tivesse tempo para tudo. Mas, se vc pegar o sentido existencialista, cada dia da sua vida ganha uma preciosidade e um sentido de urgência existencial enormes.
A National Education Association (NEA) — reconhecida pelo seu hiper-conservadorismo - viu-se em dissolução após perder a sua sede. O presidente da NEA disse: "Se não mudarmos a maneira que fazermos negócio, estaremos fora em 10 anos" - declaração impensável uns anos antes deles virem o fim tão próximo. Encarar a morte nos olhos não é fácil. Mas, é necessário! Isso ajuda a antecipar-se aos desastres e valorizar as paixões além da auto-satisfação.

Cuidado (care)
Heidegger focou o cuidado como algo que diferencia os seres-humanos das criaturas puramente cognitivas, Cartesianas. Pensamos, calculamos e cogitamos diferentemente dos computadores. Meu computador não se importa com nada. Um faca é boa para cortar, um computador é bom para calcular. Cada um com a sua função. E eu, em que sou bom? Se o significado de cada vida pudesse ser resumido em funções, nos tornaríamos algo como uma ferramenta, um mero meio para os fins. E o desejos, vontades das pessoas envolvidas? Isso não pode ser ignorado. Ainda mais para um existencilista, que valoriza o poder de inovação, liberdade de se reinventar.
As organizações precisam se reinventar... ou morrer.

Estar-lançado
É claro que as empresas não podem se reinventar do nada. Não se pode ignorar nesse momento o histórico. A IBM não vende comida de cachorro. Heidegger chamou isso de condição não-determinística, Geworfenheit, estar-lançado, carregando coisas do passado. Cada um de nós herdou muito dos nossos pais, da nossa cultura, da comunidade. Mesmo para as maiores empresas, extrapolar do passado é um guia pobre para o panejamento estratégico. Cenários pessimistas e otimistas baseados nos elementos presentes mostram oportunidades recompensadoras e, ainda assim, uma vasta possibilidade.

Autenticidade
É uma forma de ser verdadeiro consigo mesmo. Mas, cuidado pq para o existencialista pode representar uma não verdade de sua essência. Autenticidade demanda fidelidade com o seu passado, mas tb abertura de possibilidades para o futuro. É fazer escolhas e tomar responsabilidade por elas.
Se vc tenta ser verdadeiro em sua essência - sua competência principal - então vc negará a sua liberdade. Caso contrário, vc é livre para fazer o que quiser, caso esqueça o seu 'estar-lançado'. Nós carregamos um passado que não podemos ignorar. As habilidades que aprendemos, as competências que atingimos, as direções e poderes utilizados no presente, devemos levar para o futuro.

Resources Stuart Crainer, “The Days of Futurists Past,” s+b,Third Quarter 2000; www.strategy-usiness.com/press/article/19811 David K. Hurst, “Learning from the Links: What Systems Thinking Teaches about Golf and Management,” s+b,Fourth Quarter 2000; www.strategy-business.com/press/article/14057
Art Kleiner, “The Man Who Saw the Future,” s+b,Spring 2003; www.strategy-usiness.com/press/article/8220 Randall Rothenberg, “Arie de Geus: The Thought Leader Interview,” s+b, Second Quarter 2001; ww.strategy-business.com/press/article/17421

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